segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Na estação de Artur Alvim

Banheiros públicos só devem ser usados em último caso. E o último caso é, algumas vezes, inevitável; como foi dessa vez. Foi no banheiro da estação de Artur Alvim, eu lavava as minhas mãos quando, aproximou-se de mim um mendigo esquelético e crostoso: olhou-me e sorriu. Lavou o rosto e a água desceu preta e cinza. Seu sorriso era uma miríade de cacos de dentes. Não se podia chamar aqueles fragmentos corroídos pela podridão de dentes. Encheu a boca de água, fez um bochecho e um gargarejo. Sorriu novamente e era medonho de ver-se. Mas nada comparou-se ao momento em que, enfiando a mão toda na boca, sacou de uma vez os maxilares, numa cena incompreensível. Seus dentes podres eram uma dentadura cenográfica.

2 comentários:

sabina anzuategui disse...

Adorei a cena, mas não precisa da última frase. Ela traduz pobremente o que já sentimos na descrição anterior.

sabina anzuategui disse...

Ops, só agora entendi: era realmente um objeto de figurino? o mendigo era um ator? talvez houvesse um jeito de deixar mais claro, se "cenográfico" está ali como adjetivo realista ou efeito de ênfase.

 

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