domingo, 31 de agosto de 2008

O cachorro morreu e eu nem fiquei tão triste assim

Ultimamente vivia de nariz quente porque a tristeza seca e amorna os cães, se eu soubesse então pegava-a nos meus braços e dava-lhe o amor que eu tinha pra dar e que estava ali, tão sincero e desimpedido quanto um mês de férias, eu de tristeza prolixa que gosta de se vangloriar, a cachorra com esforço enorme ainda assim servil bateu o rabo, duas três vezes, e obediente se apagou. Amar um cachorro é algo assim sem verbo, só posse. Quando criança matei o peixe e o luto foi: o que não teria mais. Hoje não sei o que será do corpo, a veterinária se encarrega, à noite uma festa e no futuro canis. O que eu tenho é mesquinhez e uma alegria dura e cheia de autocontrole, de quem pode ter.

sábado, 30 de agosto de 2008

mto difícil aqui

depois de horas de temporal a luz não voltava. os dedos pressionando o interruptor nos extremos para ouvir o som seco, que companhia. a notícia recente de que você morreu, "passou dessa pra melhor". como explicar que só consegui realmente sentir a presença da sua pessoa depois disso. você anestesiado no horizonte era a vida. a morte foi uma força. uma foto com flash de todas as fotos de repente. demoro com o álbum. uma luz. vivendo você se escondia atrás do q. não deu conta não correu atrás e por isso imagem muito clara e imaginativa era eu te ensinando a ter prazer, algo meio assim, pai, agora sente isso aqui, pai, olha eu! qual amor não traz morrer? o que sinto agora quase me mata.

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

azul- piscina

vou nadando e pensando na água dos recortes. larguei tudo meio de lado. isso me dá uma incerta tristeza. mas como podem os homens acumular tantas coisas em suas estantes e entre os seus afazeres diários: duas semanas, o tempo é relativo. depois nada cabe dentro. e pensando um pouco além: realmente não sei o que ficou decidido entre nós. falei tanto e la verdad es-que-si de tudo. nadando e pensando mil e quinhentos metros – rasos que só: eu não consigo atravessar a piscina inteira sem respirar. minha sede pausa no que não se sabe nem se soube e fico na dúvida - que faço com esses recortes. lembrei daquele cardume de peixes pintados. eu quando eu nado não entendo. mas também não me preocupo tanto assim.

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Depois de entregar sete pratos seguidos, como nunca acontece nesse restaurante, de dentro da cozinha as galochas brancas rangem uma oscilacao, semi-passos, antes so trocam o peso do corpo de um pé para o outro. Satisfaçao de cumprir, hesitaçao de nao saber como voltar, o que eu fazia agora mesmo?, a pausa de sempre. Morde o labio. Nao percebe que estou olhando. Uma gravata corre o olhar esbaforido de quem nao enxerga um palmo a direita de sua c/c. Alguem traz a mao em outro corpo, polo cor de rosa, pela cintura. Muita luz. Fecho os olhos: tua doçura que me leva. Nada é mais bonito do que uma brecha de ternura que escapa de um homem. E vem dar no céu aberto. Que pena, nenhuma Olivetti em Milano.

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Folheto rosa

Havia os livros, mas embora alguma orientação fosse melhor do que nenhuma, os livros eram coloridos, eu observava as figuras e era isso. “O que está acontecendo comigo?”... “De onde vêm os bebês?” Eu tinha também um folheto rosa que meu pai enviou pelo correio. “As mudanças da adolescência”, dizia a capa, o desenho de uma moça com os cabelos transformando-se em flores. Na escola falavam de um videogame que mostrava um homem pelado num labirinto, até encontrar uma mulher agachada e "tchum". A gente explicava a situação com onomatopéias e outros verbos engraçados: furunfar, nheco-nheco. Nós conhecíamos a função dos órgãos sexuais. Os meninos desenhavam pintos por toda a parte.

domingo, 24 de agosto de 2008

Amor depois de grande

Ele tinha o maior pau do mundo e só assim seria amado. Eu só sei falar disso? Mas era muito feio e ruim de cama, então puseram máscara de borracha sofá encapado "senta aí" e um outro, musculoso e tatuado, de cueca fio-dental. Se a sua mãe te visse agora. Mas nem ela me dava muita atenção. "Já falei pra você guardar isso". Só tinha olhos pro caçula. Faz cara de mau, isso. Soca na boca dele. Like that, bitch? Deus não desampara ninguém. Todo mundo tem o seu talento. O da outra era ser a maior pas-si-va do mundo! Passou o dia seguinte peidando que nem uma bola murcha. Tinha que ser ela, que fistava e só fazia a seco. Bareback. O cara é que nem gozou. Alguma limitação biológica, devia ser.

sábado, 23 de agosto de 2008

design de interiores

quando acordou, já passavam das 11h, horário em que os pedreiros deveriam chegar. talvez não viessem, acontece. pensou também que o condomínio não permitiria a quebra das paredes. as próprias leis da física dirão que o prédio desaba. ficaria com paredes marcadas de X. grafitadas. o lençol xadrez no chão. amarrotado e novo. o corpo nu e o travesseiro como rosto. uma quadro: o rosto que se identifica com o travesseiro. apóia-se sobre o telefone dourado, tirando-o do gancho e gritando ALÔ! inútil dizer que quando o objeto é decorativo há silêncio. pulou da cama – as compras foram desempacotadas e colocadas organizadamente no armário, como no dia em que arrumamos o quarto. quando A.B. ligou, conversando arrancou o rótulo e colou-o na TV: "flower homespray perfuma delicadamente o ambiente, criando um clima pessoal e aconchegante".

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Veprové knedliký a zelý (carne seca de porco)

Abriu a porta e me sorriu como se visse o melhor amigo voltando de uma longa temporada na Tchecoslováquia. Obviamente, esperava presentes e histórias para mostrar que lembrei dele em vários passeios. Antes, me fez ouvir atentamente todos os seus segredos íntimos e contabilizar as vezes que tinha dado para o pedreiro da casa vizinha. Aos prantos confessou que me traiu com meu marido e disse que precisava do meu perdão. Voltei pra casa com mais peso e durante duas semanas experimentei várias receitas tchecoslovacas a base de carne de porco. Meu marido reclamou que a carne era gorda, mas comeu tudo todos os dias.

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

o espelho imantado

Me é impossivel escrever desde que percebi que obrigada, o agradecimento, é uma palavra que em todas as outras linguas que conheco nao tem genero. E: existo? Se nao me lembras, se nao te escrevo? Loucura? Miragem, teus olhos por trás de mim falam, por dentro daqui me olham, em todos os espelhos deste infinito apartamento de Budapeste, pisco muito os olhos nublados, medito teu suicidio, se momento de morte em mim do amor ou se é só a sonolencia que te traz, como um galho pela margem a correnteza estanca e o dedo que me atravessa o cabelo era capaz de ser teu fantasma de pau, tua lingua, minha lingua, estrangeira de mim em qualquer parte.

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Tanta engenhosidade

"Na escola eu tinha a sensação de habilidade e domínio. As aulas do primário seguiam em seu mecanismo de pequenos problemas e soluções progressivas, mecanismo que eu identificava e em que me inseria com confiança. Às vezes competia com as professoras num estado de euforia infantil, porque meus pais me ensinavam as coisas, eu sabia que o francês era uma língua latina, sabia localizar a Índia e a Tailândia no mapa e dizia fale mais devagar em espanhol. Habla más despacito. As professoras sabiam isso? Eu duvidava." Escrevo ainda comovida com Nathalie Sarraute e sua escola primária: "Estou protegida por leis que todos devem respeitar. Tudo que me acontece aqui depende apenas de mim."

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Sobre muros

Um pedacinho do muro! Vejam só, eu lembro de quando o muro caiu. Minha sogra trouxe da Europa um cartão-postal do Landesarchiv Berlin que tem encrustado, numa caixinha circular de plástico, um naco do muro, do tamanho de uma unha, grosso como a polpa do dedão da mão. Na foto, a Volkspolizei mal humorada. E eu vi aquilo cair, estava no primeiro ano primário; a professora Elza tinha um ar seráfico. E o muro caia. Picaretas, martelos; perto de casa erguiam uma delegacia pré-construída, triste como um fóssil de museu, e eu a via de cima do trepa-trepa. Na minhas mãos, agora, um postal com um fragmento da História. Mostro para o meu pai: "Que muro? Tem um monte de entulho no fundo do quintal".

domingo, 17 de agosto de 2008

Baby Love

Deixou de fazer natação. A piscina, o banho, a água fria. Tinha o corpo pequeno, magro, muito branco e sem pêlos. O pênis minúsculo, apontavam. Japonês. Mas não sabia se era uma coisa da raça mesmo, não tinha idéia, o pai era muito fechado. Nunca vira o corpo do pai. Dos outros meninos, nenhum era japonês. O Arthur, que era mais alto, e loiro, forte, esportivo, gostava muito dele e deu um jeito de estreitar a amizade. Chamou-o para ir à sua casa, um dia, jogar videogame. Meio sem jeito, passou a mão em seus cabelos. E pediu-lhe, com vergonha, que vestisse a calcinha da irmã. Era uma calcinha rosa-bebê com detalhes de renda. O menino olhava para os tiros na televisão e assim continuou. Usava óculos. E perdeu três vidas naquela tarde.

sábado, 16 de agosto de 2008

aqui

no peitoril da janela, a xícara largada há meses, úmida da chuva. guardou ali porque um dia seria documento histórico – "a xícara receptora", "deixada naquele período", anotaria no caderno. o valor do objeto transformando o objeto de valor blá blá. enrolado entre os lençóis ele dormindo, finalmente dormindo. a fineza de perceber uma pequena carícia não humana no pênis: o sono. ao lado, o telefone da herança, dourado, não funcionava. o celular desligado. a vida cabia ali. essa dor indeterminada de haver terminado a mudança, as coisas todas guardadas no apartamento. no abrigo. tudo pronto. mas pra quando chega? na parede nova um bilhete antigo, faz um tempo: um velho calção de banho/ o dia pra vadiar.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

bilhete único (vale transporte)

Ele vinha de olhos claros e bonezinho de veludo pela rua. Só faltava um relógio de bolso para compor o visual. Talvez, um guarda chuva xadrez cairia bem – para girar no braço enquanto assobiava, já que o dia era de sol. Caminhava feliz. Bem contente. Super alegre. Chegava a ser arrogante. Sim, ele era muito arrogante envolto em tanto contentamento. Empurrei-o na frente do primeiro ônibus que passou. Quer dizer, do primeiro ônibus de cor amarela e placa “Realengo”. Não ia dar o prazer a ele de morrer chique num “vermelho-Leblon”.

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

österreich

Meu ponto mais ao leste no mundo, de Viena a Budapeste rumo, mas onde fica o centro de tudo? Nao sei diferenciar quando bate o coracao ou o estomago e nao entendo porque chamam de "limpo" o ceu quando o azul vai ao fundo. Dentro do trem o padre passa e repassa com os mesmos aros de tartaruga do Sartre. Me olha. Meu namorado no Brasil completa 58 anos. Chove. A agua corre limpa pelos Alpes. Casas austriacas agueadas, por 15 metros nao se afogaram os fios de alta tensao. Por cerca de metros metade da Áustria se salvou de ficar sem luz. Creem alguns que a igrejinha no alto da encosta por onde a água se desviou os protegeu. Mas o paroco, de volta a sombra da sacristia, lembrando meus joelhinhos, apalpou o roxo veludo e gritou: -Blasfemia!- mas isso foi em alemao.

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Crianças da rua

Meu pai nunca foi mulherengo. A moça que engravidou foi sua única traição, conforme disse muitos anos depois. Eu acreditei. "Sua mãe é uma montanha-russa", ele disse. "Às vezes me assusta." Entre outros detalhes em que enxergo algum significado, está a personalidade dessa jovem virgem, órfã de pai. Assistente social, mais baixa e, conforme disseram, menos bonita que minha mãe. Provavelmente sim, menos bonita, porque ainda impressionam as fotos daquela época. Não creio que o pai quisesse mesmo uma amante: uma mulher a mais, seu pequeno harém, uma fonte extra de sexo. Talvez quisesse apenas descansar, um pouco de afeto. A mãe dizia: "Seu pai era bonzinho com as crianças da rua."

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Sobre a beleza casual e a beleza intencional

Uma coisa é a beleza de rios e lagos e matas. Há gente que a considera a beleza ideal. Porém, a vejo como um acaso; é bonito, claro, mas algo que foi intencionalmente feito para ser belo, pela mão e engenho do homem, é muito mais belo, porque é a beleza intencional e procurada. Não só nas obras de arte, mas também nos objetos cotidianos. Em Paranapiacaba, há o velho pátio da ferrovia, e nele há vagões que jazem e se desfazem; é triste vê-los assim, as chapas esburacando-se sob a umidade constante e alimentando os líquens que lhe nascem sobre. Assim como o museu ferroviário é tristonho: os vagões parados são como as carcaças de boi que jazem no semi-árido, sem água; e aqui não é a morte do acaso, é a morte do engenho.

domingo, 10 de agosto de 2008

agosto mês do desgosto

escreve um email diz que o ebó tá pronto a mamãe varando acesa a madrugada jogando tetris no celular ganhando todas geladeira forno freezer microondas o lobisomem rodeia a casa pedindo sal diz "não dou" pra você ver o que acontece e o vô falou que veio o papa expulsar os bichos maus se eu fosse mau não tava aqui tem que esperar descarregar pra carregar pra descarregar senão fode a bateria mamãe encaixa faz sardinha papai fez a primeira quimioterapia vai ficar careca e envelhecido com anemia comer fígado luz acesa na cozinha nem vem lobisomem eu vou prender a respiração e se eu contar até quarenta eu salvo o mundo

sábado, 9 de agosto de 2008

a destruição de Babellen

arcaico bisonho: se uma coisa equivale a outra coisa, como essa coisa permanecerá ela mesma? você consegue escutar? um burburinho. isso é o quê, prazer em substituir? que quer essa sua gente, esse um marulho? árabe xacriabá grego negro, essa morte? que querem e por que na superfície? patinação, onde fica esse delírio? aqui, há uma montanha pra dentro em meu peito que se faz côncavo para que eu enxergue-me-se: bem profundo: querer que seja simigualzim-mim. vocês arrivistas só chegam no pesadelo-lê: VIEMOS MOSTRAR: A REALIDADE NEGA, SEMPRE – ó: grriiitam deliiiram o tempo inteeeiro do tempo dos tempos: "La litteratuuura: la contestação-ão de la philologie-i". nas entradas do livro descobri uma realidade administrativa: a circunscrição circunscreve. grito VIVA! – o burburinho de-sa-pa-re-ce.

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Códigos e alianças

Sempre achei tricô um porre. Quando meus netos nasceram, eu já sabia os códigos da Hermes e da Quatro Estações de cabeça. Nunca veio um só conjuntinho de cor diferente ou número menor. Desde nova achava cabelo grisalho um pavor e aderi ao acaju antes do baile de debutante. Nunca gostei dessa tradição de duas alianças após a viuvez. Quando meu primeiro marido morreu, transformei a aliança em um brinco – ela era fina e só deu para um. Dois dias após a morte do segundo, fiz o outro brinco e com o ouro que sobrou um pingente de coração trancado. Pena que não deu para fazer a chavinha.

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

sentimento de piscina

seilá porque, talvez um pouco por causa da saudade, o nome dela era Laura. mas isso não significa - eu recorto. natação três vezes por semana. ela fazia de um jeito a água bater nas pernas, as pernas na água, o braço adentrando a superfície e subindo: água espirrando por cima e para os lados num barulhinho bom demais para ser verdade. e quando nadava costas tinha era certa vertigem de quem não sabe longe ou perto o fim: há que ficar de olho nas bandeirinhas esticadas no teto ou no tempo. quando nada peito, pensamentos lentos. e borboleta - borboleta não é nada leve nessas horas. Laura sai da piscina transparente e azul, com os sentidos super molhados. que tudo a textura dessa toalha.

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

cuco

Fabriquei um relogio de se comer feito torta e tirado dele um pedaco o tempo se equilibrava endurecido, o mundo todo estatico por uma hora, enquanto meus dotes enalteciam calmos e eu aproveitava todo o silencio para te tocar. Foi assim te dei um, te dei dois e quando chegou o terceiro filho, nao havia partida que nao me levasse ao redor dele. Feito mariposa rondando lata d'agua pra ver sua asa, preso um narciso de meia-tigela, as digitais dos seus dedos, meu menino, a maozinha por envelhecer levando a boca microbios e balizas futuras, racoes diarias de cuticulas, proteinas que continuam a crescer enquanto morres. Porque no meu relogio-pao, a morte tem alguma duracao, inequivoca, inexpressa, intermitente.

terça-feira, 5 de agosto de 2008

O fundo da mochila

Quando chego no centro de documentação abro minha mochila, separo duas canetas, a folha impressa com a lista dos personagens, o caderno novo onde comecei minhas anotações. Caderno e folha estão guardados em uma pasta, ao fundo da mochila, antes da pequena necessaire azul onde levo bolachas integrais para o lanche. Uma caneca plástica para beber água sem gastar copos descartáveis e, encaixada entre a pasta e a necessaire, um estojo com MP4 e fone de ouvido. Cuidado obsessivo de guardar tudo em pequenas bolsas, bolsas dentro de bolsas. Queria não ter estudado nada sobre videogames, nunca ter jogado The Sims, nunca saber como a vida é sistemática.

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Sobre os dicionários

Critica-se por aí a petulância da gramática e a aridez dos dicionários. Que quer essa gente? O ridículo dicionário do quotidiano, com cento e oitenta verbetes, todos substantivos concretos e verbos-coringa? O dicionário, ao contrário do que dizem, não é uma ferramenta; pode sê-lo. É como um enxó etrusco que aflora à superfície: teve uso de ferramenta; hoje, é o tesouro que conta sobre o passado; não é o enxó produzido em qualquer fundição boca-de-porco. Por isso a necessidade de dicionários. Entristece-me quando entro numa casa e, de olho na estante, não vejo dicionários. Onde vão as pessoas ver suas dúvidas? O que pode ser muito pior: talvez aquela gente sequer tenha dúvidas.

domingo, 3 de agosto de 2008

A vingança do Boi Bolha

com a Andrea e o Gustavo

O Batman acaba de sair do cinema, há luzes por todo o lado e ninguém sabe que ele é, na verdade, Bruce Wayne, o milionário gostosão que vive recluso nos limites de Gothan City. As luzes do shopping não permitem que se formem sombras e Batman procura, meticuloso, um modo de desaparecer. Ninguém o reconhecerá aqui, há outras pessoas vestidas de Cavaleiro das Trevas, no máximo ele será alguém com um bom alfaiate e hoje é tão fácil caminhar entre as lojas. "Você quer catchup, meu bem?". Olho para os lados, nem sinal de vilões. Na minha frente, um hamburguer vermelho exala o cheiro doce e quente da vingança. Esperar, esperar. O maxilar duro estraçalha o hamburguer. Será esta a última refeição do Homem Morcego?

sábado, 2 de agosto de 2008

desgosto

os sinônimos, dizendo o mesmo sem fato, a coisa sem si, dizendo sem de fato ouvir. correspondência? como um equivalente pode se desenvolver de maneira tão fria? estendido aí, dicionarizado, prostrado dizendo que? vi claramente que não é um tecido – não são retalhos – NEM VEM com essa história de que texto é trama, o texto é o desenvolvimento de microorganismos, uma cultura de bactérias, um caralho o texto é o suor, muita umidade o texto, tecido só se for histológico, células se trocando o tempo inteiro. como é que existe sinônimo? se uma coisa equivale a outra coisa, como essa coisa permanecerá ela mesma? você consegue escutar? um burburinho. isso é o quê, prazer em substituir? sinônimo apodrece na redondeza da boca ó: desgosto, insatifação, aflição.

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

A CHEGADA

Nunca fui tão feliz na minha vida. E olha que não vivi pouco. O meu quarto aqui no asilo é o mais movimento. E não é por acaso. Sempre soube receber. Quando meus filhos me internaram achando que iriam por fim a minha vida sexual, mal sabiam que ela só ficaria mais animada e rentável. Afinal, sempre soube receber. No começo, era tudo um hobby, quase uma brincadeira de criança. Com o surgimento das pílulas azuis passei a cobrar com desconto direto nas aposentadorias. Tem muito velho que gosta de bancar o esclerosado para não pagar. Faço fiado sim, mas só por crédito consignado. E nunca, mas nunca em mais de seis prestações. Posso ser velha, louca não.
 

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