O oftalmologista disse que ela não enxergaria mais direito; seu mundo se resumiria a borrões desfocados da realidade, certas coisas muito miúdas e alheias ao cotidiano, seriam, logo, invisíveis. Principalmente aquelas minudências que fogem ao pente grosso da vida: sensibilidades, boas maneiras, alegrias, pensamentos questionadores. Então, pensou, não seria exatamente uma doença, mas uma bênção; de quanto sofrimento inútil não lhe livraria essa imprecisão óptica progressiva? E havia a possibilidade do apagamento passar aos ouvidos e à mente. Só um detalhe, esse sim, importantíssimo como nenhum outro o é: havia coisas que manteria nítidas: as ranhuras das moedas e as minúsculas impressões nas cédulas do Banco Central.
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Um comentário:
"o pente grosso da vida"
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